O que é Neurossífilis e Por Que Ela Desafia os Médicos

O que é neurossífilis e por que ela ainda representa um desafio para os médicos?

A neurossífilis é uma infecção que afeta o sistema nervoso central, causada pela bactéria Treponema pallidum, a mesma responsável pela sífilis. Essa condição pode se manifestar em qualquer uma das fases da infecção sífilis, o que torna o diagnóstico um grande desafio para os profissionais de saúde.

Comprometimento e manifestações clínicas

A neurossífilis pode afetar diferentes estruturas do sistema nervoso central, incluindo:

  • Líquor (líquido céfalo-raquidiano)
  • Meninges (membranas que envolvem o cérebro e a medula espinhal)
  • Vasos cerebrais

Nas fases mais avançadas da infecção, o parênquima cerebral e a medula espinhal podem ser afetados, resultando em formas graves da doença, como:

  • Paralisia geral progressiva, também conhecida como general paralysis of the insane
  • Tabes dorsalis

Apesar de ser uma condição conhecida há séculos, a neurossífilis tem se tornado mais frequente, especialmente com o aumento global nos casos de sífilis. O alerta é ainda mais significativo, pois os sintomas podem imitar outras condições neurológicas, tais como acidente vascular cerebral (AVC), esclerose múltipla, demência ou psicose.

Sinais clínicos que levantam suspeita de neurossífilis

Neurossífilis precoce

Os sinais de neurossífilis em sua fase precoce incluem:

  • Meningite, que pode ser assintomática ou sintomática
  • Síndrome meningovascular, que pode resultar em AVC isquêmico em jovens

Neurossífilis tardia

Na fase tardia, os sintomas podem incluir:

  • Demência progressiva
  • Alterações de personalidade, mania ou psicose
  • Tabes dorsalis, que se caracteriza por dor lancinante nos membros, incontinência urinária, ataxia sensitiva e pupilas de Argyll Robertson, que “acomodam, mas não reagem”

Atenção: Nem todos os pacientes com neurossífilis apresentam lesões cutâneas ou têm uma história clara de infecção por sífilis recente.

Diagnóstico: como confirmar a condição?

O diagnóstico de neurossífilis é realizado principalmente através de uma punção lombar, onde o líquido cefalorraquidiano é analisado, em conjunto com dados clínicos e laboratoriais. Os achados essenciais para confirmar o diagnóstico incluem:

  • VDRL no líquor: um teste que é específico, mas com sensibilidade variável
  • Pleocitose linfocítica e hiperproteinorraquia
  • Testes treponêmicos positivos

É fundamental que os médicos considerem a neurossífilis em casos de sintomas neurológicos inexplicados, especialmente em pacientes com histórico de infecções sexualmente transmissíveis (ISTs).

Tratamento: a penicilina ainda é o padrão-ouro

O tratamento ideal para neurossífilis é:

  • Penicilina G cristalina administrada por via intravenosa durante 10 a 14 dias

Para pacientes que são alérgicos à penicilina, alternativas temporárias incluem:

  • Ceftriaxona
  • Dessensibilização à penicilina para garantir o tratamento adequado

Após a conclusão do tratamento, é necessário monitorar o líquor a cada seis meses até que os níveis se normalizem. O início precoce do tratamento é crucial para evitar sequelas neurológicas permanentes.

A relevância da neurossífilis na prática clínica atual

A neurossífilis não é uma condição do passado; ela continua a ser uma preocupação nos consultórios e emergências médicas, muitas vezes apresentando-se como quadros neurológicos ou psiquiátricos comuns. Reconhecer a possibilidade de neurossífilis pode ser decisivo para reverter um quadro clínico ou permitir uma deterioração irreversível do paciente.

Referências

  • Hamill MM, Ghanem KG, Tuddenham S. State-of-the-Art Review: Neurosyphilis. Clin Infect Dis. 2024;78:e57.
  • Wu S, Ye F, Wang Y, Li D. Neurosyphilis: insights into its pathogenesis, susceptibility, diagnosis, treatment, and prevention. Front Neurol. 2023;14:1340321.
  • Lukehart SA, Hook EW 3rd, Baker-Zander SA, et al. Invasion of the central nervous system by Treponema pallidum: implications for diagnosis and treatment. Ann Intern Med. 1988;109:855.
  • Rolfs RT, Joesoef MR, Hendershot EF, et al. A randomized trial of enhanced therapy for early syphilis in patients with and without HIV infection. N Engl J Med. 1997;337:307.
  • Marra C, Sahi S, Tantalo L, et al. Enhanced molecular typing of Treponema pallidum: geographical distribution of strain types and association with neurosyphilis. J Infect Dis. 2010;202:1380.
  • Merritt HH, Adams RD, Solomon HC. Neurosyphilis. Oxford University Press, New York, 1946.
  • Moore JE, Hopkins H. Asymptomatic neurosyphilis. JAMA. 1930;95:1637.

Nota de Responsabilidade:Os conteúdos apresentados no MedOnline têm caráter informativo e visam apoiar decisões estratégicas e operacionais no setor da saúde. Não substituem a análise clínica individualizada nem dispensam a consulta com profissionais habilitados. Para decisões médicas, terapêuticas ou de gestão, recomenda-se sempre o acompanhamento de especialistas qualificados e o respeito às normas vigentes.